A importância do apoio psicológico para quem vive com HIV
Psicólogos do HDT lidam com angústias de pacientes que enfrentam preconceitos com a doença que um dia foi considerada sentença de morte
A humanização no serviço prestado às pessoas que vivem e convivem com o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) é característica primordial da gestão, que trabalha diariamente para promover assistência de qualidade aos pacientes, preocupando-se não somente com o reestabelecimento da saúde, mas também com o equilíbrio social, biológico e psicológico.
Uma das principais barreiras enfrentadas por pessoas vivendo com o HIV é a revolta e a dificuldade de aceitação do diagnóstico. Isso ocorre porque o desconhecimento, gerador do preconceito, é um dos principais fatores de exclusão social da Pessoa Vivendo com HIV (PVHA). Temendo represálias, muitos portadores de HIV não se sentem à vontade de contar sobre a doença sequer à própria família. A informação é o principal caminho para desmistificar os “medos” pré-estabelecidos na sociedade e que, muitas vezes, não correspondem à realidade da condição de PVHA.
Para ajudar os pacientes HIV positivo e suas famílias a vencerem esses medos, o apoio psicológico é essencial. O trabalho realizado pelos profissionais da Psicologia dentro do HDT, referência no tratamento de doenças infectocontagiosas, é indispensável. “Com o adoecer físico, a internação, o diagnóstico impactante e muitas vezes também o isolamento, a pessoa soropositiva pode ser afetada emocionalmente também. O acompanhamento dos pacientes que correspondem ao perfil do HDT é fundamental e o objetivo é que consigamos reduzir o sofrimento psíquico e que eles não abandonem o tratamento”, esclarece Luciana Mendonça de Carvalho, psicóloga que faz parte da equipe multidisciplinar do hospital.
Aderir corretamente ao tratamento é indispensável para reverter o quadro clínico do paciente que possui HIV. “Hoje, em virtude do tratamento antirretroviral, o paciente praticamente não tem problemas físicos. É possível melhorar a qualidade de vida e da saúde de forma geral, além de diminuir o risco de transmissão do vírus. A maior dificuldade é na parte de discriminação e aceitação social”, explica a infectologista Christiane Kobal. Ainda segundo ela, a maioria das pessoas contaminadas adere ao tratamento corretamente e pelos exames são constatados bons resultados.
“Foi com o psicólogo que descobri que o remédio era para a vida toda, mas que tomando certo eu poderia ter uma vida normal. Eu pensava que mesmo tomando o medicamento poderia ter recaídas, mas descobri que vou ser mais forte e poder trabalhar. Mas tem hora que nada ajuda”, reflete S.A., marceneiro de 43 anos, HIV positivo, internado no HDT. “Há pacientes que conseguem lidar bem, apesar do impacto inicial, compreendendo a necessidade do tratamento, porém tem pacientes que por uma estrutura emocional frágil, não conseguem enfrentar tão bem, veem isso como uma sentença de morte”, explica a psicóloga.
Ao lidar diariamente com dezenas de pessoas de diferentes origens, a equipe de Psicologia do hospital cria diferentes formas de abordagem, sempre com o pressuposto de que o paciente conseguirá aderir ao tratamento. O resgate da autoestima é uma das questões trabalhadas pelos psicólogos, já que a falta dela é um sinal comumente evidenciado entre os pacientes. Além disso, a percepção negativa do próprio corpo; dificuldade de se olhar no espelho; fuga de contatos sociais por medo de rejeição; ansiedade generalizada; medo da morte; raiva; e também depressão são alguns dos sentimentos que afligem as pessoas que se descobrem infectadas pelo HIV. “As técnicas utilizadas para combater isso são diversas, depende de cada paciente, como a escuta empática, desmistificação de fantasias acerca da doença, redução de ansiedade e de angústia, validação de sentimentos, fortalecimento de vínculo com a equipe, fornecimento de materiais informativos sobre o diagnóstico e tratamento, entre outras”, explica a psicóloga.
Atualmente, o HDT tem 9.287 pacientes PVHA registrados na farmácia ambulatorial. Cerca de 20 novas pessoas são cadastradas semanalmente para buscar a medicação, considerada fundamental para que o paciente consiga ter uma vida ativa. O marceneiro S.A. faz parte da estatística do hospital há cerca de um mês, quando recebeu o diagnóstico do seu estado de saúde. Diferente de muitos outros, recebeu o apoio instantâneo da família, mas, ainda sim, o impacto negativo foi igual. “Eu chorei, não sei como peguei, tenho medo de ‘cair em uma cama’ e ficar por lá”, relata com olhos cheios de lágrimas.
Luciana explica que, para a psicologia, a família é uma extensão do paciente e também deve receber atenção para lidar com os medos e fantasias. Para tratar as diferenças de perfis de pacientes e suas famílias, o profissional da psicologia usa diversas abordagens, podendo ser individual ou em grupo, dependendo da dinâmica de cada familiar, do vínculo que existe e da disponibilidade deles em estarem presentes e serem acompanhados pelo serviço de psicologia. “o preconceito é algo real e muitas vezes cruel na vida do PVHA. Algumas famílias sofrem preconceito de conhecidos, já outras, o próprio familiar é a pessoa que exclui, a ponto de não deixar crianças chegarem perto da pessoa, tudo isso por falta de conhecimento”, revela.
“Muitas pessoas acham que se pode transmitir HIV no contato do dia a dia, pelo beijo na boca, abraço, por compartilhar talheres e isso não existe”, afirma Kobal. Os mitos sobre a doença surgiram pelo desconhecimento acerca do HIV e da Aids, nos anos de 1980, quando a mortalidade era de 100%. A infectologista esclarece que, atualmente, as pessoas com HIV que fazem tratamento corretamente e que estão com sucesso terapêutico, a expectativa de vida é igual à população geral que vive sem o vírus.
Segundo o Programa Conjunto das Nações Unidas sobre HIV/AIDS (Unaids), o Brasil hoje tem uma das maiores coberturas de tratamento antirretroviral entre os países de baixa e média renda, com mais da metade (64%) das pessoas vivendo com HIV. Segundo o Ministério da Saúde, 87% estão diagnosticadas, 55% do total estão em tratamento e 50% de todas as pessoas estimadas vivendo com HIV estão com carga viral suprimida.